A criação da FSLN
Ante a imagem de Augusto César Sandino e Ernesto Che Guevara, ante a recordação dos heróis e mártires da Nicarágua, da América Latina e de toda a humanidade, ante a história, ponho minha mão sobre a bandeira vermelha e preta que significa “Pátria Livre ou Morrer” e juro defender com armas na mão o decoro nacional e combater pela redenção dos oprimidos e explorados da Nicarágua e do mundo!
Por esse juramento, os militantes ingressavam na principal organização revolucionária da Nicarágua: a Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN), criada em 1961. Bem antes disso, nos anos 1930, o país começava a ser governado pela dinastia Somoza, que dominaria a política do país até 1979, quando, enfim, a FSLN chegaria ao poder.
Ao fundar a organização, os guerrilheiros sandinistas olhavam para a história da resistência ao domínio estrangeiro e a governos ditatoriais em seu próprio país. Já em seu nome, a FSLN retomava o legado de Augusto César Sandino — general que liderou um exército de camponeses nicaraguenses em rebeliões contra os fuzileiros navais norte-americanos, cerca de trinta anos antes.
Entre 1927 e 1932, Sandino esteve à frente da luta do Exército Defensor da Soberania Nacional contra a presença dos Estados Unidos na Nicarágua e a repressão policial da Guarda Nacional nicaraguense — e saiu parcialmente vitorioso: os militares norte-
-americanos deixaram o país e, assim que o liberal Juan Bautista Sacasa tomou posse da Presidência, em 1933, assinou com ele um acordo de cessar-fogo.
No entanto a Guarda Nacional, chefiada por Anastasio Somoza García, seguiu operando. Em 1934, na tentativa de negociar a extinção da força repressiva, os militantes foram vítimas de emboscadas em Manágua, a capital do país. Sandino foi assassinado, mas se tornaria um importante símbolo para a FSLN na luta contra a ditadura Somoza, que chegou à Presidência em 1936.
A longa permanência dos Somoza no poder foi possível devido à forma como os governantes controlavam administrativamente todas as instâncias políticas e econômicas do país. Um poder que se estendia pelas fazendas — de café, cana-de-açúcar, algodão e gado —, editoras, usinas de energia e agências de transporte aéreo.
Nessa forma patrimonialista de gerir a Nicarágua, a violência era essencial para silenciar a oposição e se manter no poder. Numa entrevista, o jornalista brasileiro Joel Silveira perguntou a Somoza quantas fazendas ele tinha. Em tom de deboche, o patriarca da família respondeu: “toda a Nicarágua é uma imensa fazenda de minha propriedade”. Ele falava sério. Na contramão dos abusos de poder, o país continuava pobre, com um dos mais baixos índices de desenvolvimento social da América Latina. De certa forma, a fundação da FSLN foi uma expressão possível da insatisfação generalizada da população — insatisfação essa que culminou com o assassinato de Somoza, em 1956, numa festa de confraternização do governo.
Desde o início, a FSLN se identificou com o governo revolucionário de Fidel Castro, que materializou o projeto de exportar a Revolução Cubana para o Terceiro Mundo. Por esse motivo, a organização adotou a tática de guerrilha como forma de luta, instalando pequenos focos na zona rural do país. O principal desses focos ficava numa região próxima dos rios Coco e Bocay, norte do país, e planejava a primeira ação militar da FSLN.
Era o ano de 1963, e a falta de estrutura da organização, ainda incipiente, levou-a ao fracasso da ação. A Guarda Nacional descobriu os planos do ataque e se antecipou, surpreendendo a frente e matando uma dezena de guerrilheiros.
Após esse fracasso, a FSLN trabalhou de forma paciente, quase silenciosa, por muitos anos. Em meados dos anos 1970, conseguiu arregimentar um número maior de guerrilheiros, que receberiam treinamento em Cuba. Aos poucos, a dinastia Somoza (então representada por Anastasio Somoza Debayle, filho de Somoza García) foi se desgastando interna e externamente, até que em 1979 os sandinistas chegaram ao poder por meio de um golpe de Estado.
Literatura
Livro: “La Hora Cero y Otros Poemas” (1960)
Autor: Ernesto Cardenal (1925-), Nicarágua
Ernesto Cardenal, poeta e padre adepto da Teologia da Libertação, tornou-se um dos símbolos da Revolução Sandinista de 1979. No México, onde estudou, ou na própria Nicarágua, onde viveu em comunidades religiosas, Cardenal participou, desde a década de 1950, de campanhas para denunciar as arbitrariedades dos Somoza e de movimentos antiditadura.
Sua poesia, de tom fortemente engajado, buscava já naquela época falar da política, da vida prática e das coisas concretas. Segundo Cardenal, a poesia só poderia falar da realidade latino-americana e chegar ao povo se se comprometesse radicalmente com o mundo. Só assim ela poderia ser, enfim, revolucionária.
No livro “La Hora Cero y Otros Poemas”, publicado em 1960, Cardenal usa da sátira para atacar e ridicularizar os Somoza, ao mesmo tempo em que elege Sandino o o herói dos camponeses nicaraguenses. A exemplo do poema “Adelita”, muitos dos textos desse livro abordam o tema da guerra antiamericana dos camponeses (entre 1927 e 1932), as atividades de Somoza, o assassinato de Sandino e também a paisagem nicaraguense.
Na década de 1970, Cardenal viajou a Cuba, onde aderiu ao marxismo. Quando voltou à Nicarágua, juntou-se à FSLN na luta contra a ditadura. Antes de os sandinistas chegarem ao poder, era conhecido entre os guerrilheiros como “El Padre”. Após a vitória da revolução, Cardenal integraria a junta de governo como ministro da Cultura. Com seu irmão, o padre Fernando Cardenal, ministro da Educação, Ernesto teria importante atuação na Campanha Nacional de Alfabetização durante a década de 1980.
Sugestões de leitura
- “Azul...” (1888) — Rubén Dário
- “El Soldado Desconocido” (1922) — Salomón de la Selva
- “Poesías” (1931) — Alfonso Cortés
- “Poemas Nicaragüenses” (1934) — Pablo Antonio Cuadra