“República das Bananas”: a Guatemala e a UFCo
Jacobo Árbenz chegou ao poder de forma democrática, em 1951. Representava a continuidade de um projeto político progressista, inicialmente posto em prática pelo antecessor, Juan José Arévalo (1945-1950). Árbenz levou a termo um conjunto de programas socioeconômicos que estremeceram a estrutura social daquele país de quase seis milhões de habitantes — dos quais mais de 60% eram indígenas.
Para entender a singularidade do governo de Árbenz — que seria destituído por um golpe de Estado em 1954 —, é preciso voltar ao tempo em que a United Fruit Company (UFCo) se estabelecera no país, ramificara suas atividades econômicas, alargara seu poder de influência na política e atuara de forma decisiva no destino da Guatemala e de outros países da América Central.
A UFCo foi criada na Costa Rica pelo norte-americano Minor Cooper Keith, em fins do século 19, como parte da política expansionista dos Estados Unidos, que buscava ampliar seu domínio econômico sobre aquela parte do continente. Investindo inicialmente em plantações de banana, a UFCo logo assumiu outras atribuições importantes, como a construção de ferrovias, para beneficiar o escoamento de sua produção.
Nas primeiras décadas do século 20, quando as atividades da companhia já chegavam a países como Colômbia, Honduras, Panamá e Guatemala, Keith era chamado de “rei sem coroa da América Central”. O caráter exploratório da fruteira era explícito, pois sua produção se destinava ao mercado externo, comprometendo a industrialização interna daqueles países.
O poderio da companhia começou a ser afrontado, enfim, com a ascensão do presidente Juan José Arévalo, em 1945. Sua principal medida — criação do Código Trabalhista, em 1947 — desagradou profundamente os interesses da UFCo, pois, pela primeira vez, os trabalhadores tinham respaldo legal para exigir condições dignas de trabalho. Em 1951, o então presidente Jacobo Árbenz implementou, como meta primordial, um programa de reforma agrária que confiscou as terras improdutivas da UFCo e as distribuiu entre os camponeses indígenas.
Em resposta, o governo dos Estados Unidos, empunhando a bandeira do macarthismo, promoveu uma intensa “cruzada anticomunista” na Guatemala. Em 1954, o coronel Carlos Castillo Armas, com apoio do serviço secreto norte-americano e a colaboração dos governos nicaraguense (sob a ditadura de Anastasio Somoza García) e hondurenho, comandou uma invasão à Guatemala a partir de Honduras, concretizando o golpe de Estado que destituiu Jacobo Árbenz.
Galeria
Literatura
Livros: “Trilogía Bananera”: “Vento Fuerte (1949), “El Papa Verde” (1954) e “Los Ojos Enterrados” (1960)
Autor: Miguel Ángel Asturias (1899-1974), Guatemala
Em 1967, o escritor guatemalteco Miguel Ángel Asturias foi agraciado com o Prêmio Nobel de Literatura. Na academia sueca, ele discursou em nome da “autêntica novela americana”, que seria “o grito que vem do fundo dos séculos [...] dos punhos de nossos operários, do suor de nossos camponeses, da dor de nossas crianças desnutridas, reclamando o sangue e a seiva de nossas vastas terras, que correm outra vez pelos mares, para enriquecer novas metrópoles”.
Parte central de sua obra, a “trilogia bananeira” é composta pelos livros “Viento Fuerte” (1949), “El Papa Verde” (1954) e “Los Ojos de Los Enterrados” (1960), que abarcam todo o período de atuação da United Fruit Company na primeira metade do século 20.
O primeiro livro da trilogia, “Viento Fuerte”, revela a estrutura interna da companhia, a extensão de suas plantações e de seu poder, assim como as condições habitacionais e controle exercido sobre os trabalhadores. Em seguida, no livro “El Papa Verde”, lemos a história de Geo Maker Thompson, o chamado “pirata dos negócios”, inspirado em Minor Keith, um dos donos da UFCo. Mas é no último livro que Asturias assume o discurso anti-imperialista de forma mais incisiva.
Em uma narrativa envolvente — característica do realismo mágico —, o dia a dia dos trabalhadores é narrado de forma quase sagrada: sentimos o arrastar dos pés que “marchan, marchan, marchan” repetidamente, carregando a infindável “carga, carga, carga” de banana, o corpo em “sudor, sudor en ríos, en cataratas” e o esforço diário de “abrir los ojos”.
Além de denunciar o caráter exploratório da companhia — que se recusou a cumprir a legislação trabalhista de 1947 —, Asturias estabelece uma relação direta entre a UFCo e a ditadura que chegou ao poder em 1954, após derrubar o governo democrático de Jacobo Árbenz.
Sugestões de leitura
- “La Torre de Babel” (1930) — Luis Cardoza y Aragón
- “Canto a la Flor de Pascua y Siete Poemas Memorosos” (1943) — Alberto Velázquez
- “Carazamba” (1953) — Virgilio Rodríguez Macal
- “Ajyuq’: El animalero” (1990) — Humberto Ak’abal