América Latina

Venezuela

(Foto: Reprodução)

A luta armada na Venezuela

De dezembro de 1952 a janeiro de 1958, a Venezuela viveu sob o autoritarismo de Marcos Pérez Jiménez, cujo governo se caracterizou pelas obras faraônicas e pela perseguição política aos opositores, que incluía as prisões arbitrárias e o uso indiscriminado da tortura.

Em termos econômicos, Jiménez teve amplo apoio dos Estados Unidos — país habituado a patrocinar ditaduras latino-americanas, como as de Anastasio Somoza (Nicarágua) e Rafael Trujillo (República Dominicana). Apesar da considerável expansão das atividades petrolíferas,  a economia venezuelana não foi capaz de amortizar os investimentos vultosos, e o governo teve de enfrentar graves crises fiscais, que foram determinantes no crescimento da oposição ao presidente.

General Marcos Pérez Jimenez, presidente venezuelano. (Foto: Reprodução)
O general Marcos Pérez Jiménez, presidente da Venezuela de 1952 a 1958
(Foto: Reprodução)

No intuito de dar corpo político a essas insatisfações, o clandestino Partido Comunista da Venezuela (PCV) tratou de articular, entre 1956 e 1957, uma ampla frente de atuação, com a participação da Ação Democrática (AD) — um dos partidos mais tradicionais do país — e da Junta Patriótica — organização clandestina que reunia dissidentes políticos perseguidos por Pérez Jiménez.

Com greve geral, manifestações e piquetes, as ruas de Caracas foram palco de violentos enfrentamentos entre as forças repressivas do Estado e os militantes. Em janeiro de 1958, Pérez Jiménez, acuado e isolado politicamente, fugiu para a República Dominicana. Assumiu o poder uma junta provisória, que convocou eleições diretas para dezembro. O vencedor foi Rómulo Betancourt, da AD.

Logo que assumiu a Presidência, Betancourt adotou uma postura de rejeição aos comunistas, que foram excluídos da base governista. Influenciados diretamente pela Revolução Cubana, os comunistas e as outras esquerdas do país optaram pela luta armada como estratégia. De uma ala mais radical do próprio partido do presidente, liderada por Domingo Alberto Rangel e Simón Sáez Mérida, formou-se o Movimento de Esquerda Radical (MIR).

Venezuelanos comemoram a derrubada do general Pérez Jiménez. (Foto: Reprodução)
Venezuelanos comemoram a derrubada do general Pérez Jiménez (Foto: Reprodução)

A insurreição armada foi promovida fundamentalmente por militantes do PCV e do MIR, sob a liderança de Douglas Bravo. Cada um desses partidos tinha seus próprios aparatos nas cidades e no campo. Nas cidades, principalmente Caracas, operavam os núcleos armados, chamados de Unidades Táticas de Combate (UTC). Nas zonas rurais, a atuação — concentrada nas regiões andinas de Falcón, Yaracuy e Lara — se dava pela guerrilha, mediante a criação de focos, destacamentos e frentes armadas.

Em 1963, foram criadas as Forças Armadas de Libertação Nacional (Faln), uma estrutura de caráter militar comandada por oficiais dissidentes do Exército venezuelano. As Faln tinham cinco colunas guerrilheiras com aproximadamente 520 homens; o MIR e o PCV, juntos, três colunas com cerca de 100 homens. Atuando de forma articulada, a oposição armada da Venezuela foi à luta. Em Caracas, uma greve iniciada no setor de transportes se transformou em paralisação nacional e durou quase uma semana. Na zona andina, principalmente na região de Falcón, o PCV e MIR se dedicaram a implantar os focos guerrilheiros.

Venezuelanos nas ruas comemoram queda do ditador Jiménez Pérez ao lado de carro tombado. (Foto: Reprodução)
Venezuelanos nas ruas: caiu o ditador Jiménez Pérez (Foto: Reprodução)

Ao longo de todo o governo Betancourt, houve intensas manifestações, com o objetivo de impedir as eleições presidenciais de 1963, culminando com uma greve geral convocada para as vésperas do pleito. Não adiantou. A população pôde ir às urnas normalmente, e o candidato da AD, Raúl Leoni, se elegeu presidente. Com esse fracasso, as guerrilhas perderam força e, na década de 1970, já não significavam uma ameaça, apesar das várias tentativas frustradas de se reorganizar.

Militares em seus tanques, em manifestação contrária a Jiménez. (Foto: Reprodução)
Com anuência de soldados, povo toma tanques que antes eram usados na repressão
(Foto: Reprodução)

Literatura

Livro: “País Portátil”, 1968
Autor: Adriano González León (1931-2008), Venezuela

País portátil, de Adriano Gonzales Leon

O protagonista do romance de González León é complexo, cheio de medo e angústia. Sabe-se que ele se chama Andrés Barazarte e que está viajando a Bogotá “cagado de dudas y niervos” com uma mala cheia de bombas e metralhadoras. Outro personagem importante é o quase centenário avô de Andrés, Salvador Barazarte, que, desfiando suas recordações, tece similaridades entre o passado e o presente.

O romance está ancorado numa realidade objetiva, o governo de Rómulo Betancourt (1959-1964). Além disso, a história mistura aspectos biográficos, pois o autor militara em grupos revolucionários nos anos 1950. A vitória da revolução de 1959 em Cuba e sua expulsão da Organização dos Estados Americanos (OEA) em 1962 impactaram diretamente as esquerdas venezuelanas, e “País Portátil” é um romance inserido nesse momento de grande efervescência política e social.

As últimas páginas do romance anteveem o desenlace das lutas de guerrilha e da própria Venezuela, um país portátil:

[…]
Eran mil novecientos cuarenta y cinco hectáreas con cuatrocientos veintiocho metros cuadrados y quedó esta mecedora, porque no me vengas a decir que ustedes ven por mí y que estamos alivianados y que con tal haya salud, a Dios gracias, no, vayan muy largo al carajo con sus cuidados y déjenme morir.
[…]

Sugestões de leitura

  • “Las Lanzas Coloradas” (1931) — Arturo Uslar Pietri
  • “Tragedias Grotescas” (1928) — Rufino Blanco Fombona
  • “Doña Bárbara” (1929) — Rómulo Gallegos
  • “Casas Muertas” (1955) — Miguel Otero Silva