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Engenho Galileia

VITÓRIA DE SANTO ANTÃO 1º DE JANEIRO DE 1955

Desde o final da década de 1940, as terras do Engenho Galileia, localizado no município de Vitória de Santo Antão, estavam arrendadas para 140 famílias camponesas, totalizando mais de mil pessoas. Em 1954, o arrendatário José Hortêncio não conseguiu pagar o aluguel anual das terras do engenho e foi ameaçado de expulsão pelo dono da propriedade, Oscar de Arruda Beltrão.

Camponeses reunidos no Engenho Galileia. Crédito: “Correio da Manhã“, 18 de fevereiro de 1960. (reprodução)
Broche das Ligas Camponesas do Engenho Galileia. Crédito: Acervo particular Anacleto Julião.
Sede da Liga Camponesa do Engenho Galileia. Crédito: Hélio Passos/”O Cruzeiro”, 11 de novembro de 1961 (reprodução)
Planta das Ligas camponesas do Engenho Galileia. Crédito: Acervo Dops-PE
Camponeses em frente a sede da Liga Camponesa do Engenho Galileia. Crédito: “Terra Livre”, abril de 1960 (reprodução)

José Hortêncio então reuniu um grupo de foreiros e um antigo membro do Partido Comunista Brasileiro (PCB), José Prazeres, para discutir problemas como esse. A solução encontrada foi criar uma associação capaz de prestar assistência social e financeira aos camponeses filiados.

Com esse objetivo foi fundada, em 1955, a Sociedade Agrícola e Pecuária dos Plantadores de Pernambuco (SAPPP), cujas metas iniciais eram erguer uma escola, constituir um fundo funerário, adquirir implementos agrícolas e reivindicar assistência técnica do governo.

Em represália, o dono do engenho exigiu judicialmente o fim da Sociedade e a expulsão dos camponeses. Os trabalhadores rurais resistiram à intimidação e, para se defender judicialmente convidaram à associação o advogado e deputado estadual pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB); Francisco Julião.

A luta pela desapropriação das terras do engenho durou quatro anos, sendo finalmente executada pelo governador Cid Sampaio, da União Democrática Nacional (UDN).

Francisco Julião fala sobre as Ligas Camponesas e reforma agrária. Trecho do filme: "Francisco Julião: na Lei ou na Marra" (2007), de Clarice Vianna
Julião nas Ligas Camponesas. Trecho do filme: "Francisco Julião: na Lei ou na Marra" (2007), de Clarice Vianna

Tido como a primeira vitória das Ligas Camponesas do Engenho Galileia, esse evento foi crucial para a expansão do movimento para outros estados. Na virada para os anos 1960, as ligas contavam com 35 mil camponeses associados em Pernambuco e cerca de 70 mil em todo o Nordeste.

Massacre na Usina Estreliana

RIBEIRÃO 7 DE JANEIRO 1963

Em 1963, ganhava força a campanha realizada por partidos, associações e Ligas Camponesas em defesa dos direitos trabalhistas do homem do campo. A lei do 13º salário, por exemplo, entrara em vigor em julho de 1962, mas ainda não era cumprida.

Foi para exigir o cumprimento dessa lei que quase uma centena de trabalhadores rurais dos engenhos São Miguel, São José dos Palhados e Esperança se dirigiram ao escritório da Usina Estreliana, do deputado federal José Lopes Siqueira Santos (PTB), conhecido como autoritário e truculento.

Na foto superior, o deputado José Lopes fala sobre o conflito na Usina Estreliana; ao centro, o diretor do hospital de Escada pede garantias ao delegado local contra uma eventual invasão das Ligas Camponesas; Na imagem inferior, alguns dos camponeses presos após o conflito Crédito: “Diario de Pernambuco“, 8 de janeiro de 1963 (reprodução)
Vítimas do massacre na Usina Estreliana. Crédito: “Diario de Pernambuco“, 9 de janeiro de 1963

Os camponeses exibiam um documento da Delegacia Regional do Trabalho assegurando seu direito ao salário extra, mas o usineiro não quis diálogo: mandou seus jagunços atirar contra os lavradores, matando cinco deles.

O episódio, que teve grande repercussão, foi tratado na imprensa de Pernambuco como se os camponeses tivessem atacado José Lopes, que apenas reagira em legítima defesa. Essa versão, embora não se apoiasse em nenhuma evidência e conflitasse com a história de arbitrariedades do usineiro, acabou prevalecendo, e nenhum dos assassinos foi condenado.

O tenente Pompeu Florêncio, delegado de Ribeirão, e o comandante do destacamento policial do município observam os corpos das vítimas Fonte: “Diario de Pernambuco“, 9 de janeiro de 1963 (reprodução)

Usina Caxangá

ITAMBÉ JULHO E AGOSTO DE 1963

Em 1963, os lavradores do município de Ribeirão, na zona canavieira, já haviam organizado o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Palmares, que pleiteava a aplicação dos direitos trabalhistas nos engenhos e usinas da região. Foi esse sindicato que orientou os lavradores da Usina Caxangá, de propriedade de Júlio Maranhão, a exigir o 13º salário do ano anterior, que o usineiro se recusava pagar.

Cerca de 250 camponeses dirigiram-se à sede da empresa para cobrar a solução do problema. Quando lá chegaram, os que não foram chamados para uma conversa particular permaneceram no pátio; logo foram surpreendidos pelo administrador da usina e seus capangas que, armados, passaram a agredi-los. Parte dos camponeses fugiu, mas um grupo resolveu revidar as agressões; no embate, o vigia Osório Tenório Cavalcanti disparou contra o camponês José Alves de Lima, que morreu na hora.

Lavradores denunciam a existência de material bélico privativo das Forças Armadas na Usina Caxangá Crédito: “Ultima Hora“, 4 de agosto de 1963 (reprodução)
Notícia do assassinato do camponês José Alves de Lima pelo vigia da Usina Caxangá Crédito: “Diario de Pernambuco“, 26 de julho de 1963 (reprodução)

Em pouco tempo, o sindicato convocou os lavradores dos 36 engenhos da Usina Caxangá, bem como os trabalhadores industriais da empresa, para uma greve geral. Em uma grande passeata pela cidade, exigiram a prisão do assassino de José Alves de Lima e também a consolidação dos direitos trabalhistas: pagamento do 13º salário, adoção do salário mínimo regional, registro em carteira de todos os funcionários, repouso semanal remunerado e pagamento dos dias parados.

Após um mês de greve, com grande pressão popular sobre o usineiro e o poder público, uma carta de crédito do Banco do Brasil foi concedida a Júlio Maranhão, que assim não pode se recusar a atender as reivindicações dos camponeses.

Engenho Oriente

ITAMBÉ 8 DE AGOSTO DE 1963

No início da década de 1960, a região de Itambé recebia especial atenção de partidos de esquerda, da igreja católica e das Ligas Camponesas, que ali realizavam um trabalho de esclarecimento dos trabalhadores rurais sobre seus direitos. Foram criados os Conselhos Camponeses, eleitos diretamente pelos trabalhadores para atuarem como porta-vozes de suas demandas.

Com a aprovação do Estatuto do Trabalhador Rural, em junho de 1963, os conselhos passaram a convocar greves gerais, manifestações e passeatas cobrando a observância do estatuto.

Para definir as palavras de ordem do movimento camponês na Zona da Mata (norte de Pernambuco), camponeses organizam, em setembro de 1963, o 1º Congresso dos Camponeses do Município de Itambé Crédito: Arquivo Público do Estado de Pernambuco
Paulo Roberto Pinto, o “Jeremias”, assassinado no Engenho Oriente Crédito: Acervo Virtual Comissão da Verdade do Estado de São Paulo
Ficha de Paulo Roberto Pinto no Deops-SP Crédito: Acervo Virtual Comissão da Verdade do Estado de São Paulo

No dia 8 de agosto de 1963, centenas de trabalhadores do Engenho Oriente, situado na Zona da Mata pernambucana, reuniram-se na praça do distrito de Ferreiros para reivindicar o pagamento do 13º salário. Em meio à manifestação, liderada por Paulo Roberto Pinto — o “Jeremias”, um dos mais ativos militantes da região e militante do Partido Operário Revolucionário Trotskista (POR-T) —, o senhor do engenho, José Veloso Borba, chamou os trabalhadores à sede da propriedade para receberem o pagamento.

Chegando ao local, Jeremias foi brutalmente assassinado, a tiros de rifle, pelo usineiro e seus jagunços. Os culpados pela emboscada nunca foram sequer denunciados oficialmente.

Greve dos 200 mil cortadores de cana

VÁRIOS MUNICÍPIOS 19 DE NOVEMBRO DE 1963

Nos últimos meses de 1963 foi deflagrada uma das maiores greves da indústria açucareira no Brasil. O movimento, organizado pela Federação dos Trabalhadores Rurais de Pernambuco (Fetape), teve a participação de sindicatos urbanos do estado e reuniu 200 mil trabalhadores dos engenhos e usinas de açúcar reivindicando aumento de 80% nos salários.

A paralisação aconteceu no momento estratégico em que os engenhos estavam cheios de cana-de-açucar já cortada, aguardando a moagem, uma forma de pressionar agilizar as negociações, caso contrário toda a cana cortada secaria, causando enorme prejuízo. A greve recebeu o apoio de outros movimentossociais, das Ligas Camponesas e do Partido Comunista Brasileiro (PCB).

Manchete de jornal sobre as exigências dos cortadores de cana Crédito: “Terra Livre“, novembro de 1963 (reprodução)

Os usineiros reagiram com violência. Líderes camponeses e sindicais foram assassinados, mas não houve punição para os mandantes dos crimes.

A paralisação foi encerrada com o Acordo do Campo – pacto que regulamentou o trabalho dos cortadores de cana-de-açucar e proporcionou ganhos econômicos e políticos aos trabalhadores das usinas. O documento que foi assinado pelas partes e teve a mediação do governador Miguel Arraes, do Partido Social Trabalhista (PST) determinava que, além do aumento de 80% no salário, o registro na carteira de trabalho em até 60 dias, além do desconto das contribuições sindicais.

Cortadores de cana-de-açucar reunidos Crédito: “Terra Livre“, dezembro de 1963 (reprodução)
Cortadores de cana reunidos. Crédito: “Terra Livre“, dezembro de 1963