1 2 3 4 5
mg

Fazenda Pirapitinga

CANÁPOLIS 1950

Na segunda metade da década de 1940, as grandes lavouras de arroz, predominantes no Triângulo Mineiro, foram gradativamente substituídas por pastagens de gado, em consequência da expansão da pecuária em todo o país. Essa atividade, que exige bem menos de mão de obra, acabou expulsando centenas de trabalhadores das fazendas da região.

Em meio à acelerada deterioração das condições de vida das famílias de lavradores, a Liga Camponesa de Canápolis, fundada em 1949 com o apoio do Partido Comunista Brasileiro (PCB), decidiu, em assembleia realizada em 23 de fevereiro de 1950, ocupar uma das propriedades do município — a Fazenda Pirapitinga. Também conhecida como fazenda dos ingleses, por pertencer à companhia britânica Southern Territories, a propriedade era uma das muitas que haviam substituído as plantações por pastagens.

No mesmo dia decidiram ocupar a Fazenda Pirapitinga, os lavradores tomaram a sede e começaram a arrancar o capim recentemente semeado, buscando abrir espaço para o cultivo de gêneros alimentícios, era a "operação arranca-capim".

Militantes do PCB foram deslocados para a região, levando equipamentos para impressão de panfletos, armas e munições, com a intenção de deflagrar uma revolta armada. Os latifundiários, contudo, foram mais rápidos. Em poucos dias a fazenda foi retomada à força pela polícia local, numa ação que levou a prisão de 23 lavradores.

Convite para a fundação da Liga Camponesa de Canápolis, em 24 de abril de 1949 Crédito: Arquivo Público Mineiro

Pântano do Cururu

PIUÍ INÍCIO DA DÉCADA DE 1960

No início da década de 1960, uma região chamada Pântano do Cururu, na zona rural de Piuí(futuramente Piumhi) , começou a ser drenada pelo Departamento Nacional de Obras e Saneamento (DNOS). Graças à obra, a área, antes imprópria para agricultura e pastagem tornou-se extremamente fértil, o que despertou o interesse dos latifundiários vizinhos. Rapidamente, eles se apropriaram das terras e passaram a arrendá-las para os lavradores por uma taxa de até 40% da produção.

Os camponeses, contudo, sabiam que as terras haviam sido usurpadas, pois pertenciam à União. Assim, aos poucos, eles se organizaram, negaram-se a pagar o arrendamento e passaram a reivindicar a posse das terras. Apoiados pelo Partido Comunista Brasileiro (PCB), conseguiram, em dezembro de 1962, que o governo federal ordenasse a desapropriadação das terras drenadas pelo DNOS. A ordem, contudo, não foi cumprida e os conflitos se intensificaram.

Relatório elaborado para o Dops sobre “atividades subversivas” no interior de Minas Gerais. No documento, o relator Eloy Vieira dá sua versão sobre os acontecimentos do Pântano Crédito: Arquivo Público Mineiro, 23 de abril de 1962
Continuação do relatório de Eloy Vieira para o Dops detalhando os acontecimentos do Pântano Crédito: Arquivo Público Mineiro, 23 de abril de 1962
Mapa da região investigada por Eloy Vieira para o relatório elaborado para o Dops Crédito: Arquivo Público Mineiro, 23 de abril de 1962

Nesse momento, os camponeses decidiram criar o Sindicato dos Trabalhadores Autônomos de Piuí, que em sua fundação já contava com 2.500 associados. Enquanto o título de posse das terras não chegava às mãos dos camponeses, o sindicato se encarregava de garantir que a taxa de arrendamento cobrada pelos latifundiários não fosse excessiva.

Um exemplo da ação do sindicato foi o processo movido na Justiça para impedir que o arroz colhido fosse confiscado pelos fazendeiros como taxa de arrendamento. A ação, original e arrojada, teve grande repercussão, mobilizando inclusive a Superintendência de Política Agrária (SUPRA) no apoio à causa dos camponeses.

Por fim, em janeiro de 1964, o presidente João Goulart baixou decreto declarando de interesse social a desapropriação de toda a área do Pântano do Cururu. O processo, contudo, não chegaria ao fim. Com o golpe militar de abril de 1964, o sindicato rural foi reprimido. Desarticulados, os camponeses não conseguiram garantir a aplicação do decreto e, pouco depois, foram expulsos das terras.

Revolta de Poté

POTÉ INÍCIO DA DÉCADA DE 1960

Desde a década de 1950 as fazendas da região de Poté, vinham substituindo a produção de gêneros alimentícios pela pecuária. A baixa demanda por mão de obra e a necessidade de grandes extensões de terra para a criação de gado foi pretexto para que os latifundiários expulsassem boa parte dos lavradores que viviam em suas fazendas como empregados ou meeiros.

Em pouco tempo, grupos como a Juventude Agrária Católica (JAC) e o Movimento de Educação de Base (MEB) passaram a atuar na região, em defesa dos direitos dos camponeses. Em 8 de julho de 1962, foi criado o Sindicato Rural dos Trabalhadores de Poté, o primeiro legalizado no estado.

A entidade logo moveu várias ações judiciais contra os latifundiários e apresentou aos tribunais inúmeras demandas por acesso à terra, apoiando-se no fato de que a reforma agrária estava na agenda das Reformas de Base do presidente João Goulart. Os fazendeiros partiram para a violência, que se intensificaram com o golpe de 1964. Dois dias depois do golpe, a sede do Sindicato foi invadida e os principais líderes camponeses presos — muitos deles, torturados.

Três Marias

TRÊS MARIAS INÍCIO DA DÉCADA DE 1960

Em 1959, o lavrador Randolfo Fernandes de Lima conseguiu uma autorização da Marinha brasileira para ocupar uma faixa de terra localizada na margem esquerda do rio São Francisco. Como a terra era fértil e abundante, Randolfo chamou outras 14 famílias para, juntos, ocuparem juntos a região. Derrubaram as matas, construíram os ranchos e plantaram roças, alcançando bons resultados.

Passado pouco mais de um ano, entretanto, o latifundiário Olinto Gonçalves de Melo (conhecido como Neném da Teleca) declarou-se dono das terras e obteve na Justiça a ordem de despejo, realizado com grande violência.

Decididos a resistir, os camponeses fundaram, em julho de 1961, a Associação de Lavradores e Trabalhadores Agrícolas de Três Marias, que rapidamente conquistou o apoio de outras associações de lavradores, de sindicatos urbanos, do movimento estudantil e de parlamentares do Partido Comunista Brasileiro (PCB) e do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). O movimento de Três Marias ganhou força e, em outubro daquele ano, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais deu ganho de causa aos lavradores, uma vitória que fortaleceu o movimento.

A tensão aumentou na região. Os fazendeiros, as autoridades locais e a polícia, sem nenhum respaldo nos fatos, alardearam que outras fazendas corriam o risco de invasão e que haveria um “foco comunista” em Três Marias. Conseguiram o envio de agentes do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) para a região, bem como o fornecimento de mais armas à polícia local.

Ao mesmo tempo, Olinto Gonçalves de Melo tentou reverter a decisão judicial de 1961, favorável aos ocupantes da área. Novamente amplos setores da sociedade se mobilizaram na defesa dos camponeses, forçando o governo federal a desapropriar as terras disputadas para efeitos de reforma agrária.

Com o golpe de 1964, contudo, a medida foi revogada e muitos dos camponeses de Três Marias foram presos. As terras acabaram nas mãos do latifundiário e os camponeses foram expulsos da região.

Relatório elaborado por Hélio Reinaldo Ferreira e Antônio Paschoal José Greco para o para o Dops, sobre as atividades das Ligas Camponesas na região de Três Marias, em 12 de fevereiro de 1962 Crédito: Arquivo Público Mineiro
Continuação do relatório elaborado para o Dops, sobre as atividades das Ligas Camponesas em Três Marias Crédito: Arquivo Público Mineiro
Continuação do relatório elaborado para o Dops, sobre as atividades das Ligas Camponesas em Três Marias Crédito: Arquivo Público Mineiro

Fazenda do Ministério da Agricultura

GOVERNADOR VALADARES DE 1961 A 1964

Até meados de 1950, a área rural de Governador Valadares, cidade localizada no Vale do Rio Doce, era dominada pela lavoura. Com o avanço da pecuária extensiva, a região passou a atrair o interesse de grileiros, que se apossaram das terras e delas expulsaram centenas de famílias camponesas. Sem trabalho nem moradia, os lavradores migraram para a cidade, onde encontraram um novo cenário de privações.

Segundo jornais da época, mais de 13 mil famílias expulsas do campo foram viver nas favelas de Governador Valadares ou sob marquises e pontes da cidade. Os lavradores que permaneceram no campo, por sua vez, passaram a trabalhar como assalariados, meeiros ou parceiros, sujeitos às condições impostas pelos proprietários.

Camponeses em frente ao Sindicato dos Trabalhadores da Lavoura de Governador Valadares Crédito: Conteúdo Estadão AE
Francisco Raimundo da Paixão, o Chicão, fala aos camponeses em frente ao Sindicato dos Trabalhadores da Lavoura de Governador Valadares Crédito: Conteúdo Estadão AE

Essa grave situação social chamou a atenção do Partido Comunista Brasileiro (PCB), que passou a mediar, perante os proprietários e o poder público, as demandas dos camponeses. E foi assim que, sob a liderança do militante Francisco Raimundo da Paixão, o Chicão, fundou, em 1961 a Associação de Lavradores e Trabalhadores Agrícolas de Governador Valadares — transformada, dois anos depois, no Sindicato dos Trabalhadores da Lavoura de Governador Valadares, com a adesão de mais de dois mil camponeses.

Como primeira alternativa aos problemas dos lavradores, o Sindicato propôs a ocupação de uma fazenda de 800 alqueires pertencente ao Ministério da Agricultura com o objetivo de abrigar mais de 600 famílias. Poucos dias depois, os camponeses mudaram-se para a propriedade, com o apoio de outros sindicatos rurais e urbanos.

Os latifundiários da região logo reagiram. Temendo que suas propriedades também fossem “invadidas“, fundaram a Associação Rural de Governador Valadares, exigia do poder público ações repressivas contra o movimento a que chamavam de “comunista”, além de montar milícias particulares, formadas por jagunços.

No início de março de 1964 o clima na cidade já era de confronto aberto entre camponeses e latifundiários — houve até uma tentativa frustrada de assassinar o presidente do sindicato. Àquela altura, para fazer frente aos jagunços que não paravam de chegar à cidade, os camponeses também se armaram. Diante do conflito iminente, o governo federal marcou uma data para a desapropriação da fazenda: 31 de março de 1964.

Um dia antes, contudo, liderados pelos proprietários de terra, grupos armados abriram fogo contra a sede do sindicato rural. Os camponeses se defenderam e, no final do embate, o saldo era de um morto e três feridos. O golpe civil-militar ocorrido no dia seguinte causou o refluxo do movimento e pôs fim às pretensões dos camponeses da região.