Brasil conheceram um novo repertório, no qual se destacou “Chapetuba F.C.”. Nas palavras do autor, Oduvaldo Viana Filho, a peça é “uma crônica brasileira, um pouco assim nacionalista, um pouco verde-amarela das nossas coisas, das nossas bossas. Mas de qualquer maneira, me parece que já representa um pulo, um avanço no sentido de uma temática nossa”.
Chapetuba é o clube que representa o povo da pequena cidade fictícia homônima. A peça se passa às vésperas do jogo decisivo para o acesso à primeira divisão do campeonato estadual. Do outro lado, o clube adversário representa não o rival, mas o verdadeiro inimigo, detentor dos trunfos que definirão o jogo — o poder dos cartolas, na comissão de arbitragem, e o valor em dinheiro utilizado para subornar o goleiro do Chapetuba.
O texto usa o futebol, símbolo nacional, para discutir a corrupção e o poder do grande capital em detrimento dos interesses da maioria da população.
Buscando adequar o vocabulário marxista à dramaturgia nacional, Oduvaldo Viana Filho, o Vianinha, escreveu em 1960 a comédia musical “A Mais-Valia Vai Acabar, Seu Edgar”, em parceria com Chico de Assis e Carlos Estevam Martins, do do Instituto Superior de Estudos Brasileiros (Iseb). A Martins coube a difícil tarefa de traduzir em linguagem simples o denso conceito da mais-valia, para apresentá-lo didaticamente à população geral.
A montagem, dirigida por Chico de Assis e com trilha sonora de Carlos Lyra, teve ainda uma colagem de filmes, exibida no fundo do palco, realizada pelo cineasta Leon Hirszman. A produção foi marcada pela busca de maneiras eficazes de utilizar o palco na conscientização de classe do povo trabalhador.
Os versos rimados, a opção pela comédia, a parceria com o Iseb, a exposição de conceitos marxistas e a utilização do coro — que comentava a trama enquanto ela se desenrolava — foram elementos que fizeram dessa montagem, produzida pelo grupo estreante Teatro Jovem, um marco da dramaturgia engajada no movimento pela transformação social.
Apesar de o Teatro de Arena ter o realismo social como elemento estético predominante, “Revolução na América do Sul”, de Augusto Boal, saiu do padrão — foi uma experiência farsesca. Ainda que a peça fosse pontualmente realista, pois se ligava à realidade nacional do momento, seus personagens não tinham nome, mas tipificações grosseiras e diretas: Médico, Delegado, Madame, Playboy, Menino, Secretário, Deputado, Prostituta. O único personagem a receber uma identificação nominal foi José da Silva, indivíduo-síntese do povo brasileiro.
As pequenas cenas do espetáculo formavam um mosaico de sátiras que, acima de tudo, procuravam instigar no público uma percepção crítica das relações sociais e dos processos históricos pelos quais o Brasil e outros países latino-americanos vinham construindo suas identidades e culturas políticas.
As gagues concebidas por Augusto Boal e pelo diretor José Renato (fundador do Arena) em 1960 focalizavam nossos desacertos políticos — aquilo que, infelizmente, ainda fazem o Brasil ser o que é.
Para o crítico Sábato Magaldi, o paulistano Teatro Oficina foi uma espécie de continuador do Teatro de Arena e do Teatro Brasileiro de Comédia. Do primeiro, teria herdado a preocupação social e política na escolha do repertório; do segundo, o zelo pela pesquisa estética a fim de qualificar a mensagem transmitida ao público.
Em 1963, inspirado pelos ventos de mudança que pareciam soprar no país, o Oficina realizou a montagem de “Pequenos Burgueses”, texto de 1900 do russo Máximo Górki. A maneira como José Celso Martinez Corrêa (que, com Fernando Peixoto, traduziu o texto original) dirigiu o espetáculo fez saltar aos olhos da plateia as semelhanças entre o Brasil de então e a Rússia pré-revolucionária do fim do século 19, semeando na imaginação coletiva a possibilidade real de uma transformação estrutural comparável à de 1917.
A peça teve um forte efeito catártico, provocando a identificação de parte do público com os personagens e conduzindo todos a um suicídio classista coletivo: intérpretes e plateia “morrendo” pequeno-burgueses e “renascendo” revolucionários.
O espetáculo, que despertou em muitos jovens o desejo de participar de mudanças revolucionárias, seria proibido dois dias após o golpe de 1964 —ironicamente chamado de “revolução” pelos militares.
Em 1961, um acontecimento inusitado nos palcos brasileiros refletiu o ambiente político que o país vivia. O TBC, templo do teatro burguês, abrigou a peça “A Semente”, recém-escrita por Gianfrancesco Guarnieri — notório dramaturgo de esquerda que já manifestara seu pensamento político na peça “Eles Não Usam Black-Tie”, de 1958.
O enredo de “A Semente” vai além da denúncia da exploração capitalista presente na relação patrão-empregado: ele critica diretamente o PCB, explicitando suas arbitrariedades e suas diretrizes desacertadas, seja por equívoco, seja por inépcia de seus dirigentes e filiados.
Ao expor a vida interna do partido, caracterizando seus membros como prisioneiros de estruturas burocráticas e de labirintos teóricos, o texto foca um dos filiados, Agileu, que, apesar de consciente das injustiças do mundo, vivia em descompasso com a realidade — faltava-lhe sensibilidade para pôr em prática, de modo menos impessoal, o ideal revolucionário.
O texto de Guarnieri proporcionou uma nova forma de ler o Brasil, ao mesmo tempo que buscou plantar, na imaginação nacional, uma nova perspectiva de ação revolucionária.