1935 4 de abril
Congresso sanciona a 'Lei Monstro'
Alegando ameaça comunista, governo consegue garantir poderes ditatoriais
Getúlio Vargas sanciona a Lei de Segurança Nacional, que define os crimes contra a ordem política e social e estabelece penas para quem infringi-las. Elaborado pelo ministro da Justiça, Vicente Rao, e pelo deputado federal Raul Fernandes, o projeto da lei foi aprovado na Câmara dos Deputados no dia 30 de março.
A "Lei Monstro" — como ficou conhecida desde que foi apresentada no Congresso, em janeiro — acabava com liberdades garantidas pela Constituição de 1934: criminalizava a chamada “incitação ao ódio entre as classes sociais” e vetava a organização de associações ou partidos com o objetivo de subverter a ordem política ou social. Também impedia a impressão e a circulação de livros, panfletos e quaisquer publicações consideradas subversivas. Pelo mesmo motivo, sindicatos e associações profissionais poderiam ser fechados, estrangeiros naturalizados poderiam ter a cidadania brasileira cassada e serem expulsos do país; professores poderiam perder a cátedra; e funcionários públicos, o emprego.
A Lei Monstro previa ainda a cassação de patentes de oficiais das Forças Armadas cujo comportamento fosse considerado incompatível com a disciplina militar. Além disso, proibia a greve de funcionários públicos e criminalizava quem tentasse executar planos de desorganização dos serviços urbanos e dos sistemas de abastecimento, além de estabelecer sanções (incluindo fechamento) para jornais e emissoras de rádio que veiculassem matérias consideradas subversivas.
Para muitos juristas, a nova lei permitia a prisão e condenação de cidadãos sem direito à ampla defesa. Os crimes previstos pela lei seriam julgados por um tribunal federal.
A oposição à lei foi enorme por parte do movimento operário, dos militares, dos democratas e dos partidos de esquerda. Desde o final de 1934, quando surgiram os primeiros rumores da elaboração da nova lei, lideranças de trabalhadores, militares — inclusive de altas patentes — e militantes dos partidos de esquerda vinham sendo presos, manifestações e greves, duramente reprimidas, e jornalistas, agredidos e presos. As greves, que pipocaram depois da aprovação da Constituição, passaram a incluir em suas reivindicações a manutenção das liberdades que a Lei Monstro pretendia abolir.
O clima político do país se deteriorou, com confrontos entre integralistas e esquerdistas em várias cidades. A “ameaça comunista” virou um pretexto usado constantemente pela polícia e pelos governos estaduais para amedrontar a população e justificar a repressão.
Durante a tramitação do projeto de lei, no Congresso Nacional, deputados da oposição, em minoria, inúmeras vezes subiram à tribuna para denunciar suas diretrizes, afirmando que elas acabariam com as liberdades recém-conquistadas na Constituição em julho de 1934.
Mas não adiantou. Os deputados da situação nem sequer compareciam às seções, apenas apoiavam os termos da lei. Raul Fernandes, líder da bancada governista, tratou de direcionar o processo conforme os interesses do governo. Ao final, a minoria conseguiu incluir um artigo que poderia ser usado contra os integralistas: “Só o poder público tem a prerrogativa de constituir milícias de qualquer natureza, não sendo permitidas organizações de tipo militar, características por subordinação hierárquica, quadros ou formações”.
A lei foi aprovada com o voto de 116 deputados, enquanto 26 votaram contra. Encerrada a votação, o deputado Acúrcio Francisco Torres subiu à tribuna para fazer uma declaração em seu nome e do também deputado Adolfo Bergamini: “a Constituição da República — já lamentavelmente esquecida daqueles que a elaboraram — inscreve a igualdade de todos perante a lei e assegura, de modo insofismável, a manifestação mais ampla e mais livre do pensamento, permitindo a propagação de todas as ideologias. Sob a alegação, entretanto, de defesa do regime em que vivemos — que, aliás, não periga —, votou a maioria da Câmara uma lei que outro objetivo não tem senão o de garantir os que ora dominam contra os próprios interesses da Nação, que deles, cedo se fartou”.