1994 28 de fevereiro
Plano Real vence batalha contra a inflação
Plano foge do script dos anteriores e estabiliza a moeda, mas país paga alto preço
O governo Itamar Franco lança em 1994 oficialmente o Plano Real, a mais bem-sucedida iniciativa de conter o processo inflacionário que assombrou o país desde o segundo choque do petróleo e a deflagração da crise da dívida em 1979.
Sustentado por uma âncora cambial que manteve o preço da moeda brasileira abaixo de US$ 1 por quatro anos, o Plano Real estabilizou os preços da economia. Ele foi muito importante para que o país pudesse finalmente estabelecer o controle da inflação e gerar uma maior consciência antiinflacionária, absorvida e desenvolvida pela sociedade até hoje.
Entretanto, o Plano Real manteve elevadas taxas de juros, acentuou a vulnerabilidade do país frente às crises externas e favoreceu a concorrência desleal de produtos importados. Isso provocou desindustrialização e trouxe resultados muito negativos em termos de criação de empregos formais, de crescimento econômico e de concentração de renda.
Antes do Plano Real, várias outras tentativas de controle da inflação foram realizadas em governos anteriores, mas todas fracassaram. Foi o caso dos planos Cruzado 1 e 2, Bresser, Verão e Collor. Em todos eles, passados os efeitos iniciais, a inflação retornava ainda mais forte, como no último programa realizado no governo Collor (1992): em janeiro de 1994, a variação de preços atingiria o patamar de 5.500% ao ano, afetando sobretudo os mais pobres, que não dispunham da indexação da correção monetária.
O plano de Itamar Franco, criado sob a gestão de Fernando Henrique Cardoso no Ministério da Fazenda e concebido por economistas que operavam no mercado financeiro, propôs-se a interromper o processo inflacionário por meio de uma estratégia de convivência temporária de duas moedas, o Cruzeiro Real e a Unidade Referencial de Valor, a URV. Nessa fase, segundo aposta da equipe econômica, os preços da economia convergiriam para um equilíbrio. Era uma forma de indexar os preços ao dólar sem efetivamente dolarizar a economia.
Sem que a convergência de preços estivesse plenamente concluída, em 1º de julho o governo Itamar anunciaria a fase final do plano, que substituiu as duas moedas por uma outra, o real, com o valor da última cotação da URV. A antecipação foi feita por razões políticas: em março, o ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, saíra do governo para concorrer à Presidência da República pelo PSDB. A moeda estável foi instituída antes do início oficial da campanha eleitoral e as cédulas de dinheiro traziam a assinatura do ex-ministro e candidato.
A estabilidade econômica, cuja paternidade foi assumida pelo candidato do PSDB, teve o poder de reverter a tendência eleitoral registrada pelas pesquisas de opinião, que antes apontavam o candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, como franco favorito da disputa.
Nos quatro anos seguintes, a taxa de câmbio foi artificialmente sobrevalorizada por meio da fixação de um teto que não permitia ao real ultrapassar o valor de um dólar. Para manter um fluxo permanente de entrada de dólares na economia, o presidente Itamar Franco, no final de seu governo, e Fernando Henrique Cardoso, durante o seu primeiro mandato, mantiveram os juros em altos patamares.
Os preços da economia foram controlados graças a uma avalanche de produtos importados que ingressaram no país, atraídos pela sobrevalorização cambial. Essa política de contenção de preços e a manutenção do câmbio por meio de ingressos de capitais atraídos pelas altas taxas de juros e por um agressivo programa de privatizações resultaram no desequilíbrio das contas públicas e em acentuada vulnerabilidade do país às crises externas. Já em 1994, a economia brasileira seria fortemente abalada pela crise do México; em 1997, sofreria o impacto da crise no leste asiático; e, em 1998, os danos da crise russa.
O câmbio fixo e sobrevalorizado apenas viria a ser substituído pelo câmbio flutuante em 1999, logo depois de Fernando Henrique ter obtido mais um mandato nas urnas, ainda com a ajuda do legado da estabilização da moeda.
A âncora cambial, todavia, já havia produzido enormes estragos na economia. A balança comercial, que apresentava superávit de US$ 10,5 bilhões em 1994, amargou um déficit de US$ 5 bilhões, na média, entre 1995 e 1999. A dívida líquida do setor público, que era de 38,2% em 1993, saltou para 48,7% em 1999. E o país passou de um superávit nas contas correntes de 0,3% do PIB em 1994, para um déficit de 4,5% do PIB em 1998.