1959 15 de dezembro
Sudene combaterá a indústria da seca
Governo cria órgão baseado em estudo de Celso Furtado, nomeado para dirigi-lo
O presidente Juscelino Kubitschek cria a Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), subordinada diretamente à Presidência, e nomeia o economista Celso Furtado como seu superintendente. A criação do órgão tem como base o estudo “Uma política de desenvolvimento do Nordeste”, elaborado por Celso Furtado em 1958‑1959, quando esteve à frente do Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste.
A iniciativa representava uma ação do governo para evitar novos flagelos como o do ano anterior — a maior seca do século 20 até então. A região, historicamente relegada a segundo plano nos projetos de desenvolvimento, havia assistido ao desemprego e ao êxodo rural, que espalhou milhares de flagelados pelas cidades.
Furtado coordenaria o órgão até o golpe de 1964, exceto pelo breve período em que assumiria a pasta extraordinária do Planejamento (1962-1963).
À frente da Sudene, Furtado seguiria a estratégia traçada em seu livro “A Operação Nordeste”, de 1959, a partir do diagnóstico de que o assistencialismo governamental no combate à seca apenas privilegiava os grandes proprietários e estimulava a corrupção. O novo órgão federal pretendia ser um aparelho de administração eficaz, com conhecimento prático e teórico e atuação direta nos locais mais atingidos pela seca.
Protegida das injunções políticas que vinham transformando a ação governamental no Nordeste em combustível para a “indústria da seca”, a Sudene tentaria integrar a região ao esforço de industrialização e dinamização da economia do país, de forma a reduzir as disparidades regionais e, no território nordestino, a brutal desigualdade social.
O plano de desenvolvimento incentivaria a produção de alimentos e a agricultura de subsistência, contemplaria uma política de irrigação abrangente, estimularia a agropecuária e promoveria melhores condições de emprego à população marginalizada. Ou seja, a Sudene combateria o fator climático e os interesses políticos com uma estrutura produtiva eficaz.
O plano de ação original da Sudene foi colocado em prática de 1959 a 1964. Uma de suas prioridades era solucionar o problema da migração. Nesse período, em parceria com o Incra, seria criado um núcleo de colonização no Maranhão, com o objetivo de evitar que enormes contingentes populacionais migrassem das regiões afetadas pela seca, engrossando o número de desalojados nas periferias dos grandes centros.
A criação da superintendência foi fruto também de um intenso debate, que envolveu empresários, representantes da esquerda e membros da igreja católica.
Para a intelectualidade, ela representava a possibilidade de intervir numa realidade que submetia o Nordeste à extrema pobreza, enquanto outras regiões enriqueciam, e de lidar com um quadro de aguda injustiça social, em que grande parte da população era relegada à miséria, enquanto poucos concentravam poder e dinheiro. Essa intervenção teria o benéfico efeito político de subtrair poder das oligarquias regionais que dominavam a política nacional.
A partir do golpe de 1964, a Sudene seria submetida ao Ministério do Interior, perdendo autonomia, recursos, capacidade de ação e estrutura administrativa — e, principalmente, seu idealizador, Celso Furtado —, até ser extinta, em 2001, sob acusações de clientelismo.