1978 - 1983
Os trabalhadores erguem a cabeça
Novo Sindicalismo (1978 - 1983)
No dia 12 de maio de 1978, os trabalhadores da fábrica de caminhões da Scania, em São Bernardo do Campo (SP), cruzaram os braços exigindo um aumento salarial de 20%, acima do reajuste estipulado pelo governo. A greve da Scania – que rapidamente se alastrou por um grande número de fábricas na região do ABC paulista – foi o sinal de que um poderoso ator social estava entrando em cena no país: a classe trabalhadora. O movimento expressava um novo sindicalismo; combativo, autônomo e organizado a partir da base. Surpreendeu a ditadura e alterou os rumos da “abertura”, a transição conservadora do regime que excluía os trabalhadores.
O Novo Sindicalismo, ou “sindicalismo autêntico”, como também se tornou conhecido, desafiou a legislação antigreves e começou a romper as amarras da organização sindical subordinada ao Estado, modelo implantado no país desde a década de 1940. Os trabalhadores impulsionaram a luta pela redemocratização não somente por meio de greves: iriam criar seu próprio partido, o PT, em 1980, e a Central Única dos Trabalhadores, a CUT, em 1983. Articulado com outros movimentos sociais, o Novo Sindicalismo levaria a pauta dos trabalhadores às ruas e à Assembleia Constituinte (1987-1988), conferindo nova qualidade à luta política na transição da ditadura para o regime democrático.
Os principais expoentes do Novo Sindicalismo eram de uma geração formada sob a repressão do regime militar, que atingiu duramente os sindicatos e organizações políticas da classe trabalhadora. Uma das primeiras medidas após o golpe de abril de 1964 foi a proibição do Comando Geral dos Trabalhadores (CGT), a central sindical ligada ao antigo PTB e ao PCB. O presidente do CGT, Dante Pelacani, foi cassado e perseguido; o vice-presidente, Clodesmidt Riani, foi preso; mais de mil sindicalistas foram cassados, muitos foram presos ou exilados. Cerca de 600 sindicatos sofreram intervenção da ditadura em 1964 e 1965.
A repressão implantou uma política de arrocho que reduziria os salários em cerca de 20% entre 1965 e 1967. O valor real do salário mínimo seria reduzido em 42% entre 1964 e 1974. Para minar a resistência dos trabalhadores, o direito à estabilidade no emprego após dez anos de contrato – que favorecia a organização nos locais de trabalho – foi substituído pelo Fundo de Garantia do Tempo de Serviço; uma nova legislação praticamente impediu as greves a partir de junho de 1964.
Mesmo nessas condições, várias categorias conseguiram manter a combatividade. Em abril de 1968, uma grande greve na região de Contagem e Belo Horizonte conquistou um aumento nacional de 10%. A repressão caiu sobre os trabalhadores depois da vitória, com a demissão dos líderes e ativistas. Seus nomes foram incluídos numa lista de perseguição, que os impediu de trabalhar em qualquer fábrica da região.
No Primeiro de Maio de 1968, em São Paulo, sindicalistas e militantes de esquerda protestaram no palanque da solenidade oficial. Em junho, em Osasco, uma greve com ocupação de fábrica foi reprimida por tropas do Exército. A greve de Osasco terminou com a prisão de centenas de trabalhadores.
A repressão que se seguiu ao AI-5, em dezembro de 1968, parecia ter calado definitivamente a voz dos trabalhadores. Foi um período de resistência silenciosa nas fábricas e em poucos sindicatos, pois a maioria das entidades estava sob intervenção de agentes da ditadura ou sob a direção de “pelegos”, sindicalistas controlados pelos patrões.
A nova liderança sindical se formou na medida em que os trabalhadores percebiam o esgotamento do “milagre econômico”, que havia promovido o crescimento da economia e do parque industrial, ao custo de uma brutal concentração de renda. Esse modelo começou a falir a partir do choque de petróleo de 1973, seguido pela crise da dívida externa e pela estagnação da economia. A receita do regime para enfrentar a crise recaiu mais uma vez sobre os trabalhadores, submetidos a uma nova rodada de arrocho salarial e, nos grandes centros industriais, a um sistema de rotatividade pelo qual as empresas promoviam demissões em massa para reduzir os salários de contratação.