1934 - 1938

Época de extremismos

Radicalização política

Em julho de 1934 foi promulgada uma nova Constituição, e Getúlio foi eleito presidente do Brasil por mais quatro anos — não mais como “provisório”. A expectativa era que o período de turbulência e exceção que se seguira à Revolução de 1930 estava chegando ao fim.

Os movimentos sociais, que vinham sofrendo dura repressão, voltaram às ruas com a redemocratização. Greves e manifestações — muitas vezes para reivindicar o cumprimento dos direitos sancionados por Getúlio e sacramentados na nova Constituição — eclodiram por todo o país.

Por outro lado, a crise econômica que se iniciara em 1929, com a quebra da bolsa de Nova York, reforçava ainda mais as teses de que o liberalismo político era incapaz de responder aos desafios de uma nova era. Em boa parte do mundo ganhavam corpo as ideologias e partidos que defendiam um Estado autoritário, fosse ele nazista ou fascista, fosse comunista, imperial ou colonialista. Além disso, a vitória dos bolcheviques na Rússia semeara no mundo capitalista o medo de transformações socioeconômicas radicais.

O Brasil, como o resto do mundo, se dividiu entre direita e esquerda. A direita se aglutinou em todo da Ação Integralista Brasileira (AIB), comandada por Plínio Salgado, com o apoio de Miguel Reale e Gustavo Barroso. Já a Aliança Nacional Libertadora (ANL), frente de esquerda cujo principal líder era Luís Carlos Prestes, reunia comunistas, socialistas, tenentistas, democratas e progressistas.

Getúlio, que tinha em seu governo pessoas ligadas tanto à direita quanto às esquerdas, assim que empossado como presidente constitucional começou a trabalhar para retirar poderes do parlamento e reforçar seu peso pessoal na definição dos rumos do país. Em dezembro de 1934, uma nova lei de segurança nacional começava a ser discutida no governo.

1934 - 1938

Os integralistas

Radicalização Política

A Ação Integralista Brasileira (AIB), dos camisas-verdes, era formada principalmente por setores conservadores da classe média urbana: padres, bispos e intelectuais católicos de direita, ao lado de militares, comerciantes, funcionários públicos e profissionais liberais. Inspirados no fascismo italiano, os integralistas tinham uma estrutura rigidamente hierarquizada sob o comando de Plínio Salgado.

Com o lema “Deus, pátria e família”, defendiam o patriarcalismo, a disciplina, a hierarquia e um ideário nacionalista, antiliberal, anticomunista e antissemita. Seus adeptos usavam uniformes verdes (daí serem chamados de camisas-verdes) e, a exemplo dos nazistas e fascistas, costumavam promover grandes manifestações públicas, de caráter quase militar, em que marchavam carregando estandartes com a letra grega Σ (sigma), símbolo do movimento. Com o braço direito erguido, desfilavam gritando “Anauê!”, uma saudação assemelhada ao “Heil Hitler!” da Alemanha nazista.

A Ação Integralista Brasileira foi criada em outubro de 1932 como um desdobramento da Sociedade de Estudos Políticos, fundada em São Paulo no início do ano por intelectuais de tendências políticas autoritárias. O Manifesto Integralista sintetizava o ideário básico da nova organização: defesa do nacionalismo, definido mais sobre bases culturais do que econômicas, e do corporativismo; combate aos valores liberais; e rejeição do socialismo como modo de organização social.

A AIB tinha sua própria milícia armada e uma poderosa estrutura de imprensa, com diversos jornais de circulação local, duas revistas, um órgão oficial — o “Monitor Integralista” — e um grande órgão de divulgação nacional, “A Offensiva”.

Getúlio não reprimiu os integralistas. Pelo contrário, muitas manifestações desse grupo tiveram o apoio e a proteção de policiais, e vários de seus encontros se realizaram em prédios cedidos pelo governo. Diversos líderes do exército e do governo eram integralistas — como Filinto Müller, temido chefe de polícia, e Lourival Fontes, que mais tarde dirigiria o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP). O então capitão Olímpio Mourão Filho, chefe do serviço secreto da AIB, é que forjou o Plano Cohen, um falso projeto comunista de tomada de poder que Getúlio usaria como pretexto para justificar o Estado Novo.

O grande número de adesões à AIB fez dela o primeiro partido político de massa organizado nacionalmente no Brasil. Em 1936, seus membros já eram estimados entre 600 mil e um milhão de pessoas.

Os integralistas defendiam uma repressão dura e ostensiva contra os comunistas, socialistas e intelectuais de esquerda, e por isso criticavam Getúlio. Mesmo assim, evitaram romper com o governo — pelo menos até 1938, comportaram-se como aliados. Nas negociações para implantar o Estado Novo, eles esperavam ser contemplados com o Ministério da Educação e Saúde Pública, o que não aconteceu.

1934 - 1938

A ANL

Radicalização política

A Aliança Nacional Libertadora (ANL) inspirou-se nas frentes populares surgidas em diversos países da Europa com o objetivo de combater o avanço do nazifascismo. Criada em 1935, ela reuniu comunistas, socialistas, liberais, feministas, católicos e antigos tenentes, como Hercolino Cascardo, Agildo Barata, João Cabanas, Silo Meireles, Miguel Costa e Roberto Sisson. Luís Carlos Prestes, que aderira ao comunismo depois de uma estadia na União Soviética, foi eleito seu presidente de honra..

A frente de esquerda começou a se formar no segundo semestre de 1934, quando alguns intelectuais e militares — entre os quais Francisco Mangabeira, Manuel Venâncio Campos da Paz, Moésia Rolim, Carlos da Costa Leite e Aparício Torelly (o “Barão de Itararé”) — passaram a se reunir no Rio de Janeiro com o objetivo de criar uma organização política que desse suporte nacional às lutas populares que se intensificavam. Em seu programa, a ANL defendia a suspensão do pagamento da dívida externa, a nacionalização das empresas estrangeiras, a reforma agrária, a proteção aos pequenos e médios proprietários, a garantia de amplas liberdades democráticas e a constituição de um governo popular, além do combate ao nazifascismo.

A adesão de intelectuais, lideranças de trabalhadores e classes médias urbanas fez a ANL crescer exponencialmente, conquistando em pouco tempo milhares de adeptos em todo o país.

Se, por um lado, Getúlio tinha uma política de tolerância com os integralistas, com a ALN as relações sempre foram repressivas, desde sua fundação. No mês em que a ANL foi lançada, o Congresso Nacional aprovou uma nova lei de segurança nacional, conhecida como a “Lei Monstro”, que acabava com liberdades garantidas pela Constituição de 1934, ao criminalizar o que chamava de “incitação ao ódio entre as classes sociais” e vetar a organização de associações ou partidos cujo objetivo fosse subverter a ordem política ou social.

A nova lei também proibia a impressão e a circulação de livros, panfletos e quaisquer publicações consideradas subversivas. Pelo mesmo motivo, dava poderes ao governo para fechar sindicatos e associações profissionais. Além disso, estrangeiros naturalizados poderiam perder a cidadania brasileira e ser expulsos do país; professores, afastados de suas cátedras; funcionários públicos, demitidos; e militares, ter cassadas as suas patentes.

Menos de dois meses após ser fundada, a Aliança Nacional Libertadora, que já contava com mais de 400 mil militantes em todo o Brasil, foi declarada ilegal por um decreto de Getúlio.

Em polos opostos do espectro político, as manifestações e comícios da Aliança Nacional Libertadora e da Ação Integralista Brasileira geralmente acabavam em pancadaria, com mortos e feridos. A repressão aos aliancistas fortaleceu cada vez mais em suas fileiras a ideia de que só seria possível mudar o país com uma insurreição. Em novembro de 1935, dirigentes do Partido Comunista do Brasil, com o aval da Internacional Comunista, decidiram derrubar o regime Vargas pela luta armada.

A insurreição começou em Natal no dia 23, quando sargentos, cabos e soldados tomaram o 21º Batalhão de Caçadores. No dia seguinte, o movimento chegou ao Recife, envolvendo civis e militares. Na noite de 26 para 27, militares do 3º Regimento de Infantaria rebelaram-se sob o comando de Agildo Barata no Rio de Janeiro, cidade onde eclodiu outro foco da sublevação, no Campo dos Afonsos. Os revoltosos foram rapidamente dominados no Recife e no Rio de Janeiro, mas em Natal conseguiram instalar um governo popular revolucionário que durou quatro dias, sob a liderança de João Praxedes de Andrade, sapateiro, membro da direção regional do PCB.

A repressão policial contra a ANL, que já era forte, se intensificou a partir daí: Getúlio decretou estado de sítio em todo o território nacional, e centenas de civis e militares foram presos e torturados — entre eles, Luís Carlos Prestes, Olga Benário, Pedro Ernesto (prefeito do Distrito Federal), lideranças comunistas e populares, intelectuais (como Graciliano Ramos e Monteiro Lobato), jornalistas e até mesmo parlamentares, como o senador Abel Chermont e os deputados Otávio da Silveira, Domingos Velasco, João Mangabeira e Abguar Bastos.

As autoridades passaram a exigir atestado de ideologia de todos os que exercessem cargos públicos e sindicais. Instituiu-se o Tribunal de Segurança Nacional encarregado de julgar com rapidez e severidade os acusados de participação na revolta de 1935.

Para o governo, o inimigo morava ao lado, era brasileiro e queria implantar o comunismo no país.

1934 - 1938

O golpe do Estado Novo

Radicalização política

Em 10 de novembro de 1937, Getúlio Vargas, alegando que havia uma nova revolta comunista em preparação, deu o golpe do Estado Nacional — que ficaria conhecido como “Estado Novo”, dadas as semelhanças com a ditadura portuguesa de Antônio Salazar. Fechou o Congresso Nacional, extinguiu os partidos políticos, suprimiu as liberdades democráticas, cancelou as eleições presidenciais marcadas para o ano seguinte e passou a exercer a Presidência como um ditador, com plenos poderes e por tempo ilimitado.

A repressão se acelerou. Plínio Salgado, chefe dos integralistas, que acompanhara a preparação do golpe e apoiara a instauração do Estado Novo, esperava ser agraciado com o cargo de ministro da Educação e Saúde Pública, mas isso não aconteceu. Logo depois, a AIB seria lançada na ilegalidade.

Em maio de 1938, os integralistas tentaram derrubar Getúlio, atacando o palácio Laranjeiras, onde vivia com a família. O golpe — ou “putsch”, como ficaria conhecido — contou com o apoio velado, ou a omissão, de altos chefes militares. Mesmo assim, foi derrotado com rapidez, e os que participaram diretamente da empreitada foram presos e torturados — alguns, mortos.

A instauração do Estado Novo em 1937, o levante integralista em 1938 e o início da Segunda Guerra Mundial reforçaram a tendência à criminalização de toda e qualquer dissidência política. Um longo silêncio se abateu sobre o Brasil.