1959 3 de outubro

Para vereador, vote em Cacareco

Rinoceronte encarna a antipolítica e recebe mais de 100 mil votos

Nas cabines eleitorais, mais de 100 mil eleitores paulistanos votam em Cacareco para vereador. Em algumas cédulas, alguns chegam a explicar: “Cansado de telecoteco, voto em Cacareco”.

Cacareco recebeu votos suficientes para conquistar uma cadeira na Câmara dos Vereadores, mas foram todos anulados — afinal, não passava de um filhote de rinoceronte do Rio de Janeiro, emprestado para a abertura do Jardim Zoológico da Barra Funda, na capital paulista.

Começou a ganhar fama política quando, no discurso de inauguração, o governador Jânio Quadros brincou: “Com o cartaz que está, Cacareco seria um forte candidato aos Campos Elísios” — referindo-se à sede do governo paulista.

O rinoceronte transformou-se em bandeira de protesto político a partir de uma sugestão do jornalista Itaboraí Martins, do jornal “O Estado de S. Paulo”. Incomodado com a falta de alternativas e a má qualidade do debate eleitoral, Martins lançou a campanha de Cacareco para vereador como forma cômica de protesto.

A notícia se espalhou, o povo aderiu à ideia, fez campanha nas ruas e várias gráficas até imprimiram cédulas com esse nome. Os eleitores se justificavam: “melhor votar num rinoceronte do que num asno” — chamando de “asnos” os candidatos a vereador e seus partidos, que faziam campanhas popularescas e de baixo nível, alguns usando até a imagem do rinoceronte.

Um candidato, obeso, comparando-se ao Cacareco, tinha o slogan “Vale quanto pesa”. Outro, lembrando o personagem “Amigo da Onça”, do cartunista Péricles Maranhão, passeava com uma onça pelas ruas.

O rinoceronte voltou ao Rio de Janeiro dois dias antes do pleito, apesar da campanha “Cacareco é nosso!”. Sua despedida, acompanhada por milhares de pessoas, foi tratada ironicamente como se ele fosse para o exílio.

A votação recebida por Cacareco só foi possível porque a votação se dava por meio de cédulas de papel em branco, que davam ao eleitor a possibilidade de escrever o que bem entendesse.