1955 19 de maio

Demônios da Garoa e a 'Saudosa Maloca'

Estoura o samba de Adoniran que fala da São Paulo dos cortiços, favelas e barracos

O grupo musical Demônios da Garoa regrava “Saudosa Maloca” com estrondoso sucesso. Sem desprezar o conteúdo de denúncia social do samba de Adoniran, o grupo vem com uma interpretação descontraída, assumindo a linguagem do compositor — a do cidadão paulistano pobre, com sotaque italiano misturado ao caipira —, porém num ritmo mais acelerado e introduzindo expressões que imprimem a marca do grupo: em vez de "onde nós passamos", entra o "din-din-donde nós passemo". No estribilho, os Demônios recorrem a um jogo fonético meio sem sentido, mas que gruda na memória do ouvinte e soa como "jogue as cascas pra lá".

Em 1951, Adoniran Barbosa, a voz do samba paulista, havia composto e lançado "Saudade da Maloca" (antes de se chamar “Saudosa Maloca”), história de três miseráveis que viviam num sobrado abandonado, até que ele é demolido e eles são obrigados a voltar às ruas. A música não chamaria a atenção até ganhar, em 1955, a versão dos Demônios da Garoa.

A canção tem a marca da vasta produção musical do compositor, ator e comediante Adoniran: uma história com personagens ("eu, Mato-Grosso e o Joca") marginalizados pelo acelerado crescimento urbano-industrial de São Paulo — uma metrópole que, por trás de slogans ufanistas como "a cidade que  mais cresce no mundo", esconde as mazelas da exclusão social.

Embalado pelo sucesso dessa gravação, Adoniran comporia duas “continuações” da canção, nas quais conta o destino dos três personagens após a demolição da maloca: “Arranjei Outro Lugar” (1956, em coautoria com Antônio Rago) e “Abrigo de Vagabundos” (1958).

O compositor Adoniran Barbosa — cujo nome de batismo era João Rubinato — se tornaria o cronista da população excluída dos benefícios da industrialização paulista, que se "malocava" em favelas, cortiços, barracões, ranchos, choupanas e abrigos temporários — as chamadas "malocas".

Seus personagens — na música, no rádio ou no cinema — seriam os "maloqueiros", os que sobraram nas bordas da grande cidade industrial: malandros, trabalhadores pobres, marginais e habitantes da periferia.